4,9 milhões de africanos foram trazidos como escravos para o Brasil. Nenhum outro lugar do mundo recebeu tantos escravos negros. Os que aqui chegavam vivos, aportavam no cais do Valongo. Em nenhum outro momento da história humana um porto recebeu tantos escravos.
A maioria dos escravos foi servir em fazendas.
Muito parecidas com a propriedade onde se passa o reality show, “A Fazenda”, da rede Record de televisão.
Em “A Fazenda”, os participantes precisam ser, em algum nível, famosos no mundo do entretenimento.
No período colonial, a maioria das fazendas eram engenhos de produção de açúcar.
Estruturavam-se em dois espaços: a casa-grande, onde viviam os privilegiados, e o a senzala, onde sub-existiam os escravos.
Os escravos sustentavam o engenho com seu trabalho.
Desde então, séculos se passaram até o ano de 2019.
Na noite de ontem, durante uma transmissão edição 2019 de “A Fazenda”, um funcionário chamou a participante Sabrina Paiva, negra, de “macaca”.
No momento da ofensa, a participante estava na casa-grande do lugar. O criminoso (racismo é crime) estava trabalhando atrás das paredes.
Não aguentou ver negro na casa-grande e ele ali, fora, trabalhando para a produtividade de “A Fazenda”.
Mesmo sem perceber que ali, todos, inclusive participantes, estão ali a trabalho.
Produzindo o açúcar do nosso tempo: Entretenimento.
Como o açúcar refinado, há controvérsia à respeito do mal que certos tipos de entretenimento podem fazer à nossa saúde.
A escravidão e o racismo nunca acabaram no Brasil.
Agora estão normatizadas, seja na precarização do trabalho avalizada hoje pelo governo, seja no fato de um dos únicos modos de um negro chegar hoje à casa-grande é alcançando alguma fama no mundo do entretenimento.
A escravidão e o racismo transformaram-se em algo ainda mais eficiente do que eram. Ainda mais produtivo e discreto. Nunca deixaram de existir. Muito pelo contrário.
Como o açúcar, refinaram-se.
Da Folha