Publicada originalmente n’A Diadorim
Uma benção dada a casais em um evento comunitário levou ao afastamento de Ivanildo de Assis Mendes Tavares, mais conhecido como padre Assis Tavares, de suas atividades públicas pela Igreja Católica. Como justificativa, a Arquidiocese de São Paulo apontou a presença de três casais homoafetivos entre os mais de 20 presentes na ocasião.
O casamento comunitário foi promovido pela prefeitura de Franco da Rocha (SP), na região metropolitana de São Paulo, no dia 22 de outubro. Além do padre, representantes de diferentes religiões estiveram presentes no evento.
No ofício em que comunica seu afastamento, a Arquidiocese acusa o padre Assis de ter “incorrido no delito de simulação de Sacramento”. O documento ressalta que entre os participantes do evento havia “casais com impedimentos dirimentes”, referindo-se a divorciados e homoafetivos.
Como punição, o religioso fica proibido de exercer qualquer função sacerdotal. O texto é assinado pelo arcebispo de São Paulo, Dom Odilo Scherer, e pelo chanceler do arcebispado, padre Everton Moraes.
Em entrevista à jornalista Ana Helena Tavares, o padre Assis ressaltou que não realizou qualquer casamento no evento de Franco da Rocha, reforçando que apenas abençoou os presentes. “Dei uma benção como dou benção para cachorro, para gato, para carro, para casa”, argumentou. Abençoar objetos inanimados é uma prática comum no catolicismo.
“Eu não poderia falar pros três casais homoafetivos ‘saiam agora porque agora vou dar a benção’”, justificou. O religioso afirmou ainda que acredita que o fato de ser negro contribuiu para a sua punição.
Nascido em Cabo Verde e radicado no Brasil desde 2012, o padre Assis disse estar com a consciência tranquila e que, apesar da suspensão, não pretende abandonar a religião. “Eu acredito nesse Jesus que acolhe, acolhe pessoas. […] Estou feliz porque o meu crime foi benzer pessoas”, declarou.
Despedida
Na quarta-feira (7 dez.), padre Assis Tavares escreveu uma carta a amigos e à comunidade da Vila Prudente, onde exercia suas funções. No texto, ele disse que, em mais de 20 anos de ordenação, conheceu “seminaristas, padres, bispos e cardeais homoafetivos que amam, que dedicam, que se doam totalmente em prol do Reino de Deus, porém, ontologicamente, são ‘mas não existem’.” “Pois se amanhã quiserem construir famílias e ter uma relação assumida, mesmo que doaram a vida inteira em prol do reino, por enquanto, não terão direito a uma bênção oficial da madre Igreja Católica, Apostólica Romana.”
Segundo o religioso, “em pleno século 21, ainda a questão é: é permitido ou não abençoar publicamente casais homoafetivos na Igreja Católica Apostólica Romana?”. “Estamos discutindo uma coisa bem séria, pois podemos ordenar pessoas homoafetivas mas não podemos abençoá-las.”
Na carta, ao dizer que vai para Cabo Verde, Assis fala também que prefere “um dia conversar com o meu sobrinho e minha sobrinha, que nem conheci ainda, dizendo que: ‘o seu tio foi suspenso da arquidiocese de São Paulo, por benzer pessoas’. Porém não foi por causa de: ter roubado a Igreja, ter enfrentado o caso de pedofilia, ter engravidado alguém, ter que pagar pensão, ter separado famílias”.
A Diadorim procurou a Arquidiocese de São Paulo, que não se manifestou até a publicação deste texto.