A economia global inicia a semana sob o impacto do ataque dos Estados Unidos a instalações nucleares iranianas, no sábado. O bombardeio aumentou as preocupações sobre os preços internacionais do petróleo, que já acumulavam alta acentuada este mês, num cenário econômico internacional já fragilizado desde o tarifaço de Donald Trump.
Economistas ouvidos pelo GLOBO avaliam que a pressão sobre a commodity será grande, pelo menos nos próximos dias, mas é difícil fazer apostas sobre a dimensão e durabilidade da alta.
No curto prazo, os bancos centrais que já estavam começando a colocar no radar possíveis quedas nas taxas de juros mais à frente — como o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) e o BC brasileiro — deverão travar qualquer discussão neste sentido até que o quadro se estabilize e os efeitos sobre a inflação estejam mais claros.
— Em um primeiro momento, qualquer banco central pensando em cortar juros deve ficar pensando mais. No Brasil, vai depender muito do câmbio e da vontade do BC em interferir. Mas se havia apostas em cortes (de juros) no início do ano que vem, isso deve ser menos precificado ou retirado da precificação da curva — disse ao GLOBO o ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central Tony Volpon.
Ontem, como reação ao ataque americano, o Parlamento iraniano aprovou o fechamento do Estreito de Ormuz, no Oriente Médio, por onde passa boa parte das exportações de petróleo do mundo. No mercado internacional, a cotação do barril de petróleo do tipo Brent, o mais negociado, chegou a subir 5,7% no início das negociações, a US$ 81,40. Mas no início desta segunda-feira, já havia perdido fôlego e avançava 0,72% por volta de 7h15. Há um mês, o barril não chegava a US$ 64.
O que Wall Street antes via como um evento de baixa probabilidade agora está sendo tratado como um risco.
— Se as exportações de petróleo pelo Estreito de Ormuz forem afetadas, poderemos facilmente ver o petróleo valendo US$ 100 — disse Andy Lipow, presidente da Lipow Oil Associates.
Após a eclosão da guerra entre Israel e Irã, analistas do JPMorgan previram que o fechamento do Estreito de Ormuz poderia elevar os preços do petróleo para US$ 120 ou até US$ 130 por barril.
Se o petróleo bruto atingir essa faixa, analistas preveem que os preços da gasolina e do diesel podem subir até US$ 1,25 (cerca de R$ 6,85) por galão nos Estados Unidos. Um galão corresponde a 3,78 litros.
—Os consumidores estariam olhando para um preço médio nacional de gasolina em torno de US$ 4,50 (cerca de R$ 24,50) por galão — disse Lipow.
Sem bola de cristal
A ameaça do Irã de fechar o estreito não é de agora. Em várias outras situações de crise internacional os iranianos colocaram no tabuleiro a intervenção na passagem marítima, que é responsável pelo fluxo de cerca de 20% a 30% de todo o petróleo comercializado globalmente.
O estreito também é crucial para o transporte de gás natural liquefeito (GNL), com 20% do comércio mundial, segundo dados da Agência Internacional da Energia (AIE). Apesar de o bloqueio ter sido aprovado ontem pelo Parlamento, ainda precisa passar pelo Conselho Supremo de Segurança Nacional e pelo líder supremo do país, o aiatolá Ali Khamenei.
Segundo Helder Queiroz, do Grupo de Economia da Energia do Instituto de Economia da UFRJ, a extensão dos desdobramentos para a economia vai depender do que virá de agora em diante.
— Eu não tenho bola de cristal, ninguém tem, mas uma alta nesta segunda-feira de US$ 5 a US$ 10 ou até mais (no preço do barril) não será surpresa, ponderando que o petróleo fechou a US$ 77 na sexta-feira, contra US$ 88 há um ano — afirma ele. —Mas é preciso lembrar que, em 2022, no início do conflito entre a Rússia e a Ucrânia, o preço do petróleo superou US$ 120 e isso levou a uma inflação mundial imensa.
‘Economias sobrevivem’
David Zilberstajn, ex-diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP) e professor da PUC-Rio, lembra que o petróleo já foi cotado acima de US$ 100 em diversos momentos e “as economias sobrevivem” e “não há um desarranjo profundo”.
Para ele, ao menos nos últimos 50 anos não há modelo confiável que acerte o preço futuro do petróleo, mas há efeitos previsíveis:
— Há sempre muita especulação, muito chute. Tem sempre muita gente interessada no preço de uma commodity que impacta o mundo. Muita gente vai ganhar dinheiro — observa. — Para os americanos, por exemplo, viabiliza projetos de petróleo que ficaram parados (com a queda de preço). São milhões de interesses cruzados. Demanda cautela. Pode ter um soluço, no primeiro momento, que muitas vezes não dura uma semana.
EUA fazem apelo à China
Zilberstajn avalia que, mesmo a China, que hoje compra a maior parte de seu petróleo do Irã, não ficará sem a commodity, porque a tendência é que outros produtores supram a demanda do país asiático. Ontem, o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, pediu que a China pressione o Irã a não fechar o Estreito de Ormuz.
Queiroz, da UFRJ, avalia que o Brasil pode ter algum ganho num cenário de alta de preços:
— O preço alto traz um conforto para o travesseiro do (Fernando) Haddad (ministro da Fazenda), com arrecadação de royalties mais alta. Daria um certo respiro (nas contas). Também melhora a balança comercial — pontua Queiroz. — De outro lado, afeta a inflação. A Petrobras tem sido cautelosa em repasse de preço (dos combustíveis), mas teria de subir em algum momento — disse. (Com agências internacionais)