Uma declaração aparentemente descontraída do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), durante uma aula magna reacendeu tensões políticas no Maranhão e aprofundou o racha entre os aliados do governador Carlos Brandão (PSB) e o grupo formado por políticos próximos ao ex-governador e atual integrante da mais alta Corte do país.
Ao sugerir, no dia 9, que a professora Teresa Helena Barros poderia compor uma “chapa imbatível” ao lado do vice-governador Felipe Camarão (PT) nas eleições do ano que vem, Dino provocou reações imediatas entre articuladores do governo estadual, que consideraram a fala uma interferência política indevida.
Aliados de Dino saíram em campo para tentar minimizar a declaração. Classificaram o comentário como uma brincadeira, sem intenção de interferir no processo político. Segundo eles, a professora não possui filiação partidária nem idade mínima exigida para disputar o cargo, o que reforçaria o caráter informal da declaração.
— Dino é ministro do Supremo, mas estava ali como orador, em um momento de descontração. Essa fala está sendo explorada para desgastar a imagem dele — afirmou o deputado federal Duarte Júnior (PSB), que busca manter diálogo com os dois grupos.
Especialistas, contudo, alertam para os limites da atuação de magistrados.
— O próprio estatuto da magistratura proíbe manifestações políticas por parte de juízes. Mesmo em tom de brincadeira, quando essas falas ocorrem em público e em meio a disputas acirradas, tornam-se impróprias — avaliou o professor de Direito Constitucional Rafael Paiva.
Dino governou o estado por dois mandatos e teve Brandão como vice. Os dois, no entanto, estão rompidos.
Dúvidas sobre a lealdade
A pré-candidatura de Camarão ao governo estadual, já lançada pelo PT, enfrenta resistências no núcleo político de Brandão. A principal queixa é a de que o vice-governador estaria alinhado com Dino, gerando dúvidas sobre sua lealdade em um eventual processo de transição de poder.
As divergências têm raízes em um acordo informal costurado durante as eleições de 2022. Na ocasião, teria sido pactuado que Brandão deixaria o cargo em março de 2026 para disputar o Senado, abrindo caminho para que Camarão assumisse o governo e concorresse a um novo mandato. Mas o cenário político mudou.
Fortalecido no cargo, Brandão hoje considera outros nomes como potenciais sucessores. Entre os cotados estão seu sobrinho Orleans Brandão e o deputado federal Pedro Lucas Fernandes (União Brasil), este último visto como alguém com maior capacidade de articulação política.
Em entrevista recente ao GLOBO, Brandão demonstrou insatisfação com os movimentos do vice:
— Qual é o jogador de futebol que não quer jogar na seleção? Fui vice por oito anos e sonhava em ser governador, mas nunca falei. Fiquei aguardando, nunca provoquei.
Para aliados do governador, a fala de Dino explicitou uma atuação política que, segundo eles, já vinha ocorrendo de maneira velada. A crítica mais contundente, neste momento, recai sobre o que consideram uma suposta interferência do ministro em processos judiciais que influenciam diretamente o cenário político estadual.
Um exemplo citado é a decisão de Dino que suspendeu o processo de escolha para uma vaga de conselheiro no Tribunal de Contas do Estado (TCE), aberta há mais de um ano. A decisão foi tomada após uma ação da Procuradoria-Geral da República (PGR) e do partido Solidariedade — presidido no Maranhão pelo deputado estadual Othelino Neto, marido da senadora Ana Paula Lobato (PDT), que herdou o mandato no Senado com a nomeação de Dino ao STF.
Na decisão, o ministro considerou inconstitucionais trechos da legislação estadual que exigiam apoio de pelo menos um terço dos deputados para a indicação e proibiam o apoio simultâneo a mais de um candidato. Aliados de Brandão desconsideram a manifestação da PGR e alegam que Dino estaria supostamente agindo em favor dos interesses de seu grupo.
Othelino nega conexão de Dino com ações que protocolou:
— Se no Maranhão existe uma forma de atuar no arrepio da lei, é nosso direito acionar a Justiça. Houve ações que obtivemos êxito, outras não. Óbvio que não dá para supor que os ministros decidiram por influência do Dino. Tivemos decisões contrárias de (Luiz) Fux e (Alexandre) Moraes e ações distribuídas que sequer foram julgadas.