O ano de 2020 se aproxima do fim e os clubes brasileiros, aos poucos, começam a ter noção mais consolidada do grande prejuízo gerado pela pandemia do novo coronavírus. Foi uma temporada desafiadora para todos. A diminuição dos valores dos contratos de televisão, a falta de público nos estádios e a ausência dos patrocinadores devem levar as principais equipes do País a registraram receitas até 46% menores em relação a 2019. Os dados são de uma projeção feita pela consultoria Sports Value, especializada em finanças e balanços de clubes.
O estudo mostra que, em média, os clubes brasileiros vão perder entre 29% e 37% das receitas neste ano. Os dois times que mais devem ser atingidos pela queda serão Cruzeiro e Santos. Ambos devem ter diminuição de 46%. Para o responsável pela pesquisa, Amir Somoggi, os números são reflexo de uma política financeira em que as equipes dependem quase exclusivamente de poucas fontes financeiras para sobreviver.
“O impacto poderia ser menor para as equipes, talvez na casa dos 18% a 20% de redução. Os clubes poderiam ter trabalhado em outras frentes. Quase 80% do sustento das equipes depende de patrocínio, cotas de televisão e venda de jogadores. Justamente essas receitas são as que mais sofreram o impacto da pandemia”, explicou Somoggi ao Estadão. Para produzir o estudo, ele acompanhou os balanços periódicos das equipes.
Cruzeiro e Santos aparecem na frente dos demais por razões diferentes. O time mineiro vive uma grave crise financeira desde o ano passado e amargou nesta campanha grande redução da receita por causa do rebaixamento à Série B do Campeonato Brasileiro. No caso do Santos, uma das causas é o fato de o ano de 2019 ter sido muito positivo nas finanças graças à venda de jogadores. Por isso, o cenário comparativo apresenta grande queda.
Aliás, a verba com transferências foi a responsável por diminuir os elevados prejuízos. O estudo mostra que Flamengo, Grêmio e Corinthians compensaram algumas perdas grandes causadas pela pandemia. O time carioca, por exemplo, fez dinheiro com as saídas principalmente de Reinier (R$ 186 milhões) e Léo Duarte (R$ 62 milhões). A equipe gaúcha conseguiu negociar Everton Cebolinha, presença frequente nas listas de convocações para a seleção brasileira com o técnico Tite, com o Benfica por R$ 128 milhões. O mesmo time português de Lisboa pagou cerca de R$ 131 milhões por Pedrinho, do Corinthians.
Por causa da negociação por Pedrinho, o Corinthians é quem apresenta a menor queda de receita do estudo, com somente 4%. Outra causa para isso é o fato de o clube ter apresentado em 2019 um resultado péssimo, com o déficit de R$ 177 milhões. “O impacto com a venda de jogadores neutralizou a questão econômica em algumas equipes. Os clubes não vivem mais a época de que tudo está ótimo. A dúvida agora é como conseguir sair desse grande buraco. É preciso ser criativo para conseguir reagir”, afirmou Somoggi.
O especialista recomenda que as equipes possam apostar em produtos digitais para conseguir atrair ainda mais o torcedor e gerar uma renda maior. Pela estimativa de Somoggi, a participação do torcedor nas receitas das equipes está restrita a somente 20% do total. O ideal era elevar esse porcentual para entre 35% e 40%. A maior fatia ainda é dependente de cotas de televisão, patrocínios principais e secundários e ainda a venda de atletas.
Um aspecto curioso da pesquisa é que os clubes que possuem como ponto forte as arenas sofreram bastante. Os principais exemplos são Athleticopr e Palmeiras. Pela projeção do especialista, o Alviverde terá um déficit de aproximadamente R$ 130 milhões nesta temporada. “O Palmeiras é o clube que mais depende do estádio para fechar o orçamento. A arena nova e a torcida engajada contribuem para isso. Mas na prática a equipe não tem conseguido cortar todos os custos”, explicou o especialista.
Santos e Cruzeiro. Os dois times com os piores números apresentados pela pesquisa da Sports Value admitem estar preocupados com a situação. O novo presidente do Santos, Andrés Rueda, disse ao Estadão na última semana que tem um plano para melhorar as finanças do clube da Vila Belmiro. No último sábado ele ganhou a eleição em uma disputa que contava com seis candidatos e ficará no cargo até dezembro de 2023.
“Precisamos acertar despesas ordinárias com receitas ordinárias. Teremos de fazer ajustes, gastar apenas o que temos de receitas correntes. Renegociar prazos e redução de juros com os credores. Mostrar credibilidade ao mercado destinando parte da receita extraordinária para abater as dívidas. Aos poucos, a gente vai colocando a casa em ordem”, disse o dirigente santista.
O diretor financeiro do Cruzeiro, Matheus Rocha, explicou que o clube tem estudado diversas ações para atrair mais recursos. Uma das propostas recentes foi criar um fundo de investimentos. “Estamos fazendo um experimento e temos no nosso radar outras formas de captações também”, contou.