A CPI do 8 de janeiro aprovou nesta quarta-feira (18) seu relatório final, com o pedido de indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de outras 60 pessoas, incluindo cinco ex-ministros.
O relatório da senadora Eliziane Gama (PSD-MA) foi aprovado por 20 votos a 11. Não houve abstenções. Parlamentares da base festejaram o placar levantando cartazes com a frase “Sem anistia pra golpista”, enquanto a oposição gritava “vergonha”.
O relatório final, obrigatório em comissões parlamentares de inquérito, pode apenas sugerir indiciamentos a autoridades responsáveis. A CPI pretende entregar o documento à PGR (Procuradoria-Geral da República), à Polícia Federal e ao STF (Supremo Tribunal Federal) na semana que vem.
A comissão chega ao fim após cinco meses de investigações. Com a aprovação do relatório principal, os dois documentos da oposição —com a sugestão de indiciamento de Lula (PT) e do ministro Flávio Dino (PSB)— não foram colocados em votação.
Eliziane afirmou que o dia 8 de janeiro foi “obra do bolsonarismo” e defendeu que o ex-presidente seja indiciado por quatro crimes: associação criminosa, violência política, abolição violenta do Estado democrático de Direito e golpe de Estado.
“Esse relatório é a demonstração real da vitória da democracia contra o fascismo, o fundamentalismo e a tentativa de usurpar e retirar direitos que nós levamos anos a fio através de sangue e suor, que é o nosso Estado democrático de Direito.”
Também aparecem na relação da senadora os ex-ministros bolsonaristas general Walter Braga Netto (que foi candidato a vice de Bolsonaro), general Augusto Heleno, general Luiz Eduardo Ramos, general Paulo Sérgio Nogueira e Anderson Torres.
Dos 61 nomes, 22 são militares das Forças Armadas. A CPI sugere o indiciamento do ex-comandante do Exército general Freire Gomes e do ex-comandante da Marinha almirante Almir Garnier, apontado na delação do ex-ajudante de ordens Mauro Cid.
Minutos antes da votação, o presidente da comissão, deputado federal Arthur Maia (União Brasil-BA), fez um aceno à caserna: “Não teve golpe nesse país porque o Exército, se foi chamado em algum momento para participar, disse não”.
A relatora também propôs o indiciamento do ex-diretor da PRF (Polícia Rodoviária Federal) Silvinei Vasques e de Marília Ferreira, ex-braço direito de Torres. Os dois são investigados sob suspeita de que a PRF tenha sido usada no segundo turno das eleições para tentar atrapalhar a votação de eleitores de Lula.
“A democracia brasileira foi atacada: massas foram manipuladas com discurso de ódio; milicianos digitais foram empregados para disseminar o medo, desqualificar adversários e promover ataques ao sistema eleitoral; forças de segurança foram cooptadas; tentou-se corromper, obstruir e anular as eleições; um golpe de Estado foi ensaiado; e, por fim, foram estimulados atos e movimentos desesperados de tomada do poder”, escreveu.
Durante a sessão, a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) afirmou que não teve direito de defesa e que o programador Walter Delgatti Neto, conhecido como hacker da Vaza Jato, é um “mentiroso contumaz”. Zambelli também reafirmou que ele tinha sido contratado para cuidar de suas redes.
A relatora da CPI sugere o indiciamento da deputada por associação criminosa, abolição do Estado democrático e golpe de Estado. Em agosto, Delgatti disse à CPI que Bolsonaro tentou invadir uma urna eletrônica, com apoio da bolsonarista.
A oposição criticou a decisão da relatora de não propor o indiciamento do general Gonçalves Dias, ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) de Lula. A relatora argumentou que GDias, como o general é conhecido, estava havia apenas oito dias no cargo.
“Ignorar a verdade, neste caso, não é mentir. É fraudar”, disse o senador Esperidião Amin (PP-SC), da oposição, destacando que GDias recebeu alertas da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) sobre o risco de ataques. O episódio foi revelado pela Folha em abril.
A oposição também reclamou da blindagem a Dino. Bolsonaristas argumentam que ele poderia ter acionado a Força Nacional. O ministro, por outro lado, afirma que colocou os homens à disposição do Governo do Distrito Federal, a quem cabe a proteção da Esplanada dos Ministérios.
Após a apresentação do relatório de Eliziane, a defesa de Bolsonaro divulgou nota chamando a proposta de indiciamento de parcial e tendenciosa e disse que ele não teve o direito a defesa por não ter sido convocado a prestar esclarecimentos à comissão.
“A proposta de indiciamento —para além da ausência de quaisquer elementos que conectem o ex-presidente com os atos investigados— mostra-se parcial, tendenciosa e totalmente pavimentada por viés político e não jurídico”, afirmou.
Segundo a defesa, a relatora é “sabida opositora política” de Bolsonaro. A senadora fez campanha para Lula no ano passado.
A defesa do ex-presidente disse ainda que causa indignação o indiciamento de vários civis e militares, “evidenciando a crescente hostilidade com as Forças Armadas”.
Após a aprovação do relatório, deputados e senadores da base caminharam até a praça dos Três Poderes, ao lado do Congresso. Houve uma confusão no trajeto depois que um assessor do deputado federal Carlos Jordy (PL-RJ) provocou os parlamentares.
O homem, identificado como Rodrigo Duarte, acertou a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) ao tentar pegar seu celular, que tinha sido derrubado pelo deputado federal Rogério Correia (PT-MG). “Na minha cabeça! Prende esse cara”, afirmou a parlamentar durante a confusão.
Após o tumulto, Soraya disse que a conduta do assessor era inaceitável e que registraria um boletim de ocorrência contra ele. “Se não aprenderam [após o 8 de janeiro], vai acontecer o que para aprenderem?”
Jordy disse que determinou a exoneração do auxiliar.
“Assisti ao vídeo. Não houve agressão. Ele estava filmando e gritando, e o deputado Rogério Correia bateu em sua mão para retirar seu celular, que acabou caindo na cabeça da senadora Soraya. Contudo, independentemente disto, a conduta é incompatível com a de um assessor parlamentar e sua exoneração já foi determinada”, afirmou em nota.