O subterfúgio usado para manter no cargo o diretor de Governança da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), Gil Cutrim, ex-deputado federal pelo Republicanos e representante do Centrão na estatal, comprova que governança é algo que, definitivamente, inexiste na companhia. Conhecida como “a estatal do Centrão”, a Codevasf esteve no cerne da distribuição dos recursos do “orçamento secreto” e ainda hoje é apontada como instrumento de expedição de verbas de emendas cartoriais.
O mandato de Cutrim, como informou a Coluna do Estadão, expirou no último dia 10, e a renovação está fora de cogitação desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou, por maioria, a liminar camarada do ministro aposentado – e atual ministro da Justiça de Lula – Ricardo Lewandowski, expedida em março do ano passado, que autorizava as indicações do governo para companhias públicas que feriam a Lei das Estatais. O STF demorou um ano e dois meses para julgar o mérito, mas terminou por reconhecer a validade da Lei das Estatais.
Mesmo assim, por unanimidade, os juízes da Corte permitiram, sob a alegação de que é preciso evitar instabilidade, que os que já haviam sido empossados, caso de Cutrim, poderiam permanecer até o fim dos respectivos mandatos. A autorização de Cutrim acabou, mas ele continuou, pendurado no expediente de que o estatuto da companhia, vinculada ao Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional – cujo titular é Silvio Costa Filho, seu padrinho político –, permite a permanência até que um substituto seja indicado.
Esse é apenas mais um exemplo das artimanhas que envolvem a estatal criada durante a ditadura para atuar como veículo de desenvolvimento das margens do Rio São Francisco e há muitos anos é sinônimo de fisiologismo e corrupção. A mais recente reportagem do Estadão sobre desmandos na estatal mostrou, no fim de julho, que uma auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) detectou o superfaturamento no preço do asfalto usado em obras da Codevasf em dez Estados do País.
Em 2022, durante o governo de Jair Bolsonaro, a Polícia Federal (PF) no Maranhão deflagrou uma operação para investigar suspeitas de fraudes em licitações da empresa no Estado, uma “associação criminosa estruturada”, como descreveu a PF. Em junho deste ano, a Polícia Federal concluiu o inquérito e indiciou o atual ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil), à época deputado federal pelo Maranhão, por suspeita de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa no desvio de emendas parlamentares em seu Estado.
A Codevasf foi transformada em veículo para circulação de verbas orçamentárias usadas sem transparência e serve como sumidouro do dinheiro público. A cooptação pelo Centrão não foi à toa, e a dependência do governo Lula da Silva explica, por certo, a vista grossa do petista às inúmeras acusações e suspeitas que recaem sobre seus “ministros de coalizão”. O governo Lula, com a ajuda do STF, conseguiu driblar a lei para avalizar arranjos políticos em estatais, mas a imoralidade, neste e em outros casos, grita.
De O Estadão