O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), reconheceu a crise climática causada pelas queimadas em todo País e determinou uma série de medidas a serem adotadas pelo governo federal para conter a devastação em biomas como a Amazônia e o Cerrado. Em decisão publicada ontem, 15, o magistrado autorizou, por exemplo, a abertura de crédito especial fora do arcabouço fiscal para fazer frente à devastação.
A autorização de gastos fora da regra fiscal vale até o fim de 2024. Os recursos extraordinários, contudo, só podem ser utilizados no combate ao fogo. Dino argumentou na decisão que a crise climática provocada pelas queimadas, que já atingem 60% do território nacional, é semelhante à tragédia provocada pelas enchentes no Rio Grande do Sul meses atrás.
“A semelhança jurídica é nítida em relação às recentes enchentes no Rio Grande do Sul, que redundaram em intensas medidas de socorro e reparação”, argumentou. “Sob a perspectiva de conflito entre valores constitucionais (Responsabilidade Fiscal e Responsabilidade Ambiental), deve-se fazer preponderar aquele que possui o maior risco de extinguir-se irremediavelmente, qual seja, o Meio Ambiente e a Vida das populações afetadas”, prosseguiu o ministro.
Em maio, o Congresso aprovou projeto de decreto legislativo, assinado por Lula, permitindo que despesas do governo para socorro ao Rio Grande do Sul, após a crise das enchentes, fossem excluídas do limite de gastos e da meta de resultado primário.
Dino ainda autorizou o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a eliminar o intervalo de tempo previsto em lei para contratar brigadistas temporários pelo Ibama e ICMBio. Atualmente, os órgãos ambientais precisam esperar três meses para efetuar novas contratações. O interregno ficará suspenso até o fim deste ano, assim como os gastos fora do arcabouço fiscal.
“Pode-se dizer que as consequências negativas para a Responsabilidade Fiscal serão muito maiores devido à erosão das atividades produtivas vinculadas às áreas afetadas pelas queimadas e pela seca do que em decorrência da suspensão momentânea, e apenas para estes últimos quatro meses do exercício financeiro de 2024, da regra do § 7º do art. 4º da Lei de Responsabilidade Fiscal”, escreveu Dino.
O ministro também determinou o uso dos recursos do Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividadesfim da Polícia Federal (Funapol) na condução dos inquéritos que apuram crimes ambientais, como queimadas ilegais, na Amazônia e no Pantanal.
A intenção de Dino de tirar as despesas decorrentes de ações para o enfrentamento às queimadas do limite de gastos imposto pelo arcabouço fiscal foi antecipada pelo Estadão na sexta-feira, 13. O sinal havia sido dado pelo próprio ministro quando determinou ao governo medidas imediatas para o combate ao que classificou como “pandemia de incêndios florestais”.
Devastação
A área queimada no Brasil este ano mais do que dobrou em relação a 2023. Desde janeiro, foram destruídos quase 11,4 milhões de hectares (cerca de 11 milhões de campos de futebol), alta de 116% em relação a 2023. O levantamento é do Monitor do Fogo, do MapBiomas, que reúne ONGs, universidades e empresas de tecnologia.
A escalada de focos de fogo em todo o País é a pior desde o início da série histórica do MapBiomas, de 2019. Em várias regiões do País, a fumaça de incêndios tem deixado o ar poluído e causado fenômenos como a “chuva preta”, registrada no Rio Grande do Sul. Só em agosto foram 5,65 milhões de hectares destruídos, área equivalente à do Estado da Paraíba.
Lula enviará ao Congresso, depois das eleições municipais, uma Medida Provisória com o Estatuto da Emergência Climática. A ideia é que o governo possa agir antes do desastre, com medidas que permitam desvincular a liberação de recursos federais das regras do arcabouço fiscal.