Respeitado pelos colegas e admirado pelo público, o sambista Arlindo Cruz vivia um dos pontos altos de sua carreira quando, em 17 de março de 2017, sofreu um acidente vascular cerebral. Sobreviveu, mas com sequelas graves. Nunca mais andou, falou, muito menos compôs e cantou. Sua jornada se encerrou nesta sexta-feira (8), aos 66 anos.
A informação foi confirmada por sua mulher, Babi Cruz, à Folha. Arlindo estava internado desde 25 de março no hospital Barra D’Or, na zona oeste do Rio, após receber um diagnóstico de pneumonia. Ele havia recebido alta em junho, mas piorou e seguiu no hospital.
“Com imenso pesar, a família e a equipe de Arlindo Cruz comunicam seu falecimento. Mais do que um artista, Arlindo foi um poeta do samba, um homem de fé, generosidade e alegria, que dedicou sua vida a levar música e amor a todos que cruzaram seu caminho. Sua voz, suas composições e seu sorriso permanecerão vivos na memória e no coração de milhões de admiradores”, publicou a família no Instagram do músico.
Agradecemos profundamente todas as mensagens de carinho, orações e gestos de apoio recebidos ao longo de sua trajetória e, especialmente, neste momento de despedida. Arlindo parte deixando um legado imenso para a cultura brasileira e um exemplo de força, humildade e paixão pela arte. Que sua música continue ecoando e inspirando as próximas gerações, como sempre foi seu desejo.”
Arlindo Domingos da Cruz Filho nasceu em 14 de setembro de 1958, em Rio de Janeiro, e cresceu cercado pela música. Aos sete anos, ganhou um cavaquinho do pai, que o ensinou a tocar. Na adolescência, aprendeu violão e teoria musical.
Estudou na Escola Preparatória de Cadetes da Aeronáutica, mas seu caminho era o samba. Aos 17, tocou cavaquinho no disco “Roda de Samba”, de Candeia, amigo de seu pai e seu ídolo.
No final dos anos 1970, descobriu as rodas do bloco Cacique de Ramos, na zona Norte do Rio. Logo se destacou como instrumentista e compositor, tendo músicas gravadas por Beth Carvalho, Alcione e outros intérpretes renomados. Foi expoente daquela geração que revigorou o samba —e que foi encaixotada no rótulo “pagode“.
Entrou para o Fundo de Quintal em 1981. Assumiu o banjo que cabia antes a Almir Guineto, seu mestre no instrumento e nas improvisações do partido-alto.
Foram 12 anos no conjunto, período em que se tornou uma figura conhecida, um músico requisitado para tocar em CDs de outros grupos —poucos dominavam o banjo como ele— e um compositor cobiçado.
Fez dupla com Sombrinha, também ex-integrante do Fundo de Quintal, com quem gravou cinco discos de 1996 a 2002.
Mas o vício em cocaína passou a atrapalhar o desempenho de Arlindo. Em 2003, ele parecia fadado à decadência. Sua voz estava muito comprometida, e o CD “Pagode do Arlindo”, lançado naquele ano, foi considerado precário em termos técnicos.
O marco da virada foi o disco “Sambista Perfeito”, de 2007. A faixa de abertura, “Meu Lugar”, parceria com Mauro Diniz, virou uma febre nacional. Confirmou que falar da própria aldeia —o bairro de Madureira, na zona Norte do Rio— pode ser a forma mais global de comunicação.
Nos anos que se sucederam ao seu AVC, suas pequenas conquistas eram exibidas nas redes sociais, sobretudo por sua mulher, Bárbara, a Babi. Passou por diversas internações e mais de uma dezena de cirurgias, mas segundo Babi reagia ao ouvir música e chegava a balbuciar algumas palavras.
Ele deixa os filhos Arlindo Neto, cantor conhecido como Arlindinho, e Flora, do casamento com Babi, além de Kauan Felipe, de outro relacionamento.