O diretor, produtor e escritor Cacá Diegues faleceu nesta sexta-feira aos 84 anos. Um dos fundadores do movimento do cinema novo, ele foi imortal da Academia Brasileira de Letras. O cineasta sofreu complicações de uma cirurgia na próstata. Ainda não há informações sobre velório e enterro.
“Lamentamos profundamente a morte do cineasta e Acadêmico Cacá Diegues, aos 84 anos. (…) Sua obra equilibrou popularidade e profundidade artística ao abordar temas sociais e culturais com sensibilidade. Durante a ditadura militar, viveu no exílio, mas se manteve sempre ativo no debate sobre política, cultura e cinema”, lamentou a ABL em nota oficial.
Nascido no dia 19 de maio de 1940, em Maceió, Alagoas, Carlos José Fontes Diegues se mudou ainda pequeno com a família para o Rio de Janeiro, onde estudou Direito na PUC, antes de ser completamente tomado pelo cinema.
Ativo integrante do Centro Popular de Cultura (CPC), participa da única produção cinematográfica realizada pelo órgão: “Cinco vezes favela” (1961). À frente do episódio “Escola de samba, alegria de viver”, ele divide a direção do longa ao lado de Miguel Borges, Joaquim Pedro de Andrade, Marcos Farias e Leon Hirszman.
O primeiro longa solo veio dois anos depois, com “Ganga Zumba” (1963), estrelado por Antonio Pitanga e Léa Garcia, e que, segundo a “Enciclopédia do cinema brasileiro”, foi o primeiro filme nacional com protagonistas negros.
Ainda em 1969, aproveitando um convite para participar do Festival de Veneza, Cacá deixa o Brasil e se radica em Paris, na França, contando com a companhia de sua esposa à época, a cantora Nara Leão. Após dois anos vivendo fora, retorna ao país em 1971, e realiza dois filmes aparentemente mais leves e menos ambiciosos, embora com claras conotações políticas. Assim nascem “Quando o carnaval chegar” (1972), estrelado por Nara, Chico Buarque, Maria Bethânia, Hugo Carvana e Antonio Pitanga, e “Joanna Francesa” (1973), com Jeanne Moreau.
Os anos seguintes marcariam o período de maior sucesso comercial do realizador. Em 1976, lança “Xica da Silva”, com Zezé Motta, em que retorna ao tema da escravidão 13 anos depois de “Ganga Zumba”. O filme foi visto por 3,2 milhões de espectadores no Brasil, segundo dados da Ancine. Na sequência, realiza “Chuvas de verão” (1978), com Jofre Soares e Míriam Pires, e “Bye Bye Brasil” (1980), com José Wilker, Betty Faria e Fábio Jr.. Com trilha sonora de Chico Buarque, o longa participou da mostra competitiva do Festival de Cannes.
Como toda produção da época, Cacá sofre com as ações do governo Collor que desmantelaram o cinema nacional. No período, acaba realizando duas produções lançadas diretamente na TV: “Dias melhores virão” (1989) e “Veja esta canção” (1993), coproduzido por Zelito Viana. Em 1996, lança “Tieta do Agreste”, adaptação de Jorge Amado estrelada por Sonia Braga, Marília Pêra e Chico Anysio, e vista por 500 mil pessoas, número importante no período. Dois anos depois, dirige “Orfeu” (1998), com Toni Garrido e Patrícia França, uma adaptação de Vinícius de Moraes.
Lançado em 2003, com Antônio Fagundes e Wagner Moura, “Deus é brasileiro” marcou o segundo maior sucesso comercial do realizador. O longa vendeu 1,6 milhão de ingressos. Em 2023, vinte anos depois, Cacá filma a continuação “Deus ainda é brasileiro”, que segue inédito. Seu último filme lançado comercialmente foi “O grande circo místico” (2018), exibido no Festival de Cannes.
Do casamento com Nara, Cacá teve os filhos Isabel e Francisco Diegues. O diretor e a cantora se separaram em 1977, 12 anos antes da morte da artista. O cineasta volta a se casar em 1981, com Renata Almeida Magalhães, produtora com quem iria realizar boa parte de seus filmes. Os dois tiveram a filha Flora Diegues, falecida aos 34 anos, em 2019, vítima de um câncer.
Eleito para a Academia Brasileira de Letras, em 2018, Cacá Diegues sucede o amigo e colega cineasta Nelson Pereira dos Santos na cadeira 7. Em seu discurso de posse, em abril de 2019, destaca:
— Não preciso explicar o que significa, para mim, ocupar a cadeira que foi de Nelson Pereira dos Santos, nessa Academia. Às vezes, penso até que pode ter sido uma ousadia desavergonhada de minha parte, ter-me candidatado a ela. E peço licença para acrescentar que, mexe também com meu coração e minha excitação, pensar que era esse mesmo número 7 o que víamos às costas de um dos maiores gênios barrocos de nossa história, o incomensurável Garrincha.