Em seu primeiro ato como gestor, o prefeito de Jacobina (BA), Tiago Dias (PCDOB), reduziu o próprio salário e, agora, em vez de receber R$ 15 mil, passará a ganhar R$ 1,1 mil, valor do novo mínimo, uma redução de 92%. “Se eu estou aqui, qualquer um sabe que também pode”, disse o primeiro prefeito negro da cidade, localizada na região da Chapada Diamantina.
Um dos cinco filhos de um lavrador e uma merendeira, Dias, de 37 anos, disse ter ouvido muitos comentários de deboche e preconceito na campanha eleitoral. Entre eles, um era recorrente: “Como um cabra da roça pode ser prefeito, se nem os ‘dotô’ deram certo?”
Jacobina é conhecida pela riqueza de suas minas e pela pobreza de agricultores como os da família de Dias. Ainda assim, em 8 de outubro de 2018, quando se lançou candidato a prefeito, ele decidiu que não receberia mais de um salário mínimo. A promessa, mantida em segredo, foi cumprida em decreto publicado no Diário Oficial de Jacobina na segunda-feira passada.
“Queria dar o exemplo, representar a zona rural que ganha menos do que isso. Eu não poderia estar acima”, afirmou o prefeito ao Estadão. Dias foi à cerimônia de posse montado em um boi, vestido com roupas de couro. Na declaração de bens à Justiça Eleitoral, o então candidato disse possuir três motocicletas no valor de R$ 11,5 mil. “Temos diversas Áfricas ao redor do nosso município e essa população precisa ser vista e ouvida e se ver aqui”, disse Dias.
O prefeito entrou na vida pública em 2008, quando se tornou presidente da Associação de Moradores de Cachoeira dos Alves, zona rural de Jacobina, onde nasceu e ainda mora com os pais e a caçula de suas três filhas. Aos seis anos, começou a ajudar o pai na lavoura. Depois, mudou-se para a casa de uma tia, em Jacobina, para estudar e concluir o ensino médio.
‘Suficiente’ “Temos famílias inteiras sobrevivendo com isso. Eu ainda estarei acima, com carro, assessor. Para mim é o suficiente.”
Tiago Dias (PCDOB) PREFEITO DE JACOBINA (BA)
Em 2012, Dias disputou sua primeira eleição, para o cargo de vereador. Foi o segundo mais votado na cidade. Na eleição seguinte, em 2016, foi o mais votado. Veio, então, a decisão de tentar a prefeitura. “Sempre ouvi risadinha, sofri preconceito por causa da minha origem, mas nunca me reduzi a isso nem virei vítima.”
A redução salarial do prefeito resultará em um retorno anual aos cofres públicos de, em média, R$ 170 mil. O montante, segundo ele, será direcionado a crianças em situação de vulnerabilidade social. Apesar da redução, Dias afirmou que vai viver do salário, sem nenhum trabalho extra como agricultor. “Temos famílias inteiras sobrevivendo com isso, pagando vários impostos. Eu ainda estarei acima, com carro, assessor. Para mim é o suficiente.”
A proposta do prefeito é, durante o mandato, mudar sua própria rotina para incentivar outras pessoas. O uso da bicicleta para ir ao trabalho deve ser uma delas. “Pretendemos montar a ciclovia, mas primeiro temos de mostrar que é possível. Minhas filhas também continuarão estudando em escola pública.”