Empenhado em construir uma frente ampla, que reúna a esquerda e partidos de centro, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PC do B), diz que, hoje, “ninguém tem força hoje para conter, sozinho, essa avalanche que está aí”.
Segundo ele, para que a esquerda vença as eleições, é preciso “sentar com quem pensa diferente de você”. “E não tem nada de pecaminoso.”
Por isso, o governador, que se define como um “militante antibolha”, diz preferir o apresentador Luciano Huck dialogando com ele do que com o presidente Jair Bolsonaro.
“O Brasil vive uma conjuntura de trevas. Nós temos uma ameaça objetiva à vida democrática, à dissolução da nação. O nazismo está entronizado como política de Estado daqui e de acolá. O vídeo desse secretário [Roberto Alvim] não é algo isolado. É preciso ter responsabilidade”, afirmou ao programa de entrevistas da Folha e do UOL, em estúdio compartilhado em Brasília.
Dino se refere ao vídeo com referências ao nazismo protagonizado pelo então secretário e que levou à sua demissão.
“Eu tenho responsabilidade com o Brasil e, por isso mesmo, não fico olhando preconceitos e rótulos, porque eu sei o tamanho dessa ameaça. O que estou procurando fazer é não deixar essa tal dessa bolha se cristalizar. Isso seria ruim para o Brasil.”
DEMISSÃO DE ROBERTO ALVIM
É importante assinalar que o episódio traz uma conquista civilizacional e democrática importante.
Por outro lado, é também importante destacar que a demissão do secretário é insuficiente, na medida em que não houve a revogação da concepção que embasou os anúncios que foram feitos pelo próprio presidente da República.
É fundamental que, em complemento a essa necessária atitude de demissão do secretário, que fez, na prática, apologia de um dos piores momentos da história da humanidade, haja também a revisão da política cultural no sentido de que ela não seja extremista, não seja excludente, não seja ontologicamente violenta.
FABIO WAJNGARTEN
Nós temos claramente uma situação em que há uma confusão entre o papel próprio do agente público e transações no mercado. E isso não é possível porque distorce um dos valores da nossa Constituição, que é a chamada livre concorrência.
Ora, se você tem um agente público comprometido com algumas empresas, naturalmente isso significa dizer que há objetivamente, independentemente de intenções, uma política de favorecimento de uns e prejuízos a outros.
Ou ele se livra das empresas privadas, hipótese número um, deixa de atuar no mercado diretamente ou por interposta pessoa, ou sai do governo.
O que não pode é ter a chamada porta giratória, em que o mesmo cidadão ora está dentro ora está fora.
Na medida em que até o presente momento, após a revelação dos fatos, não houve nenhuma atitude por parte de quem deveria tomar, no caso o presidente da República, é que claro que pode se configurar uma conivência com uma prática ilegal.
RELIGIÃO E POLÍTICA
A religião é algo positivo para a sociedade, é algo inerente à vida humana, desde os seus primórdios.
Eu, particularmente, tenho a minha crença religiosa e a prático e a defendo, mas claro que não é possível, em nome da chamada laicidade do Estado, que eu transforme a minha concepção religiosa em uma imposição para as outras pessoas.
Por isso, a laicidade é um mecanismo de proteção da liberdade religiosa de todos os cidadãos e de todas as igrejas.
O que estamos vendo é uma fronteira sendo ultrapassada na medida em que, por parte de alguns segmentos extremistas, há uma ideia de colonização da esfera pública por concepções religiosas unilaterais. Isso acaba sendo antidemocrático e uma violação à liberdade religiosa.
UM COMUNISTA NA PRESIDÊNCIA
Os mesmos que diziam que eu não posso concorrer à Presidência pelo PC do B são aqueles que achavam que eu jamais seria governador do Maranhão pelo PC do B.
E nós vencemos duas eleições em primeiro turno em um estado em que tive apoio de católicos, evangélicos e outras religiões. Está muito longe de ser uma verdade objetiva que isso constitui um obstáculo, e eu já testei empiricamente.
Não é verdade, nos dias de hoje, que o PC do B seja um partido antirreligioso.
Se hoje, lamentavelmente, esse preconceito ainda é repetido é por um terrível eco das heranças ditatoriais que o Brasil infelizmente carrega.
São os ecos do Doi-Codi, da Operação Bandeirante e da tortura que fazem com que esse preconceito seja alimentado. Mas ele é destituído de base objetiva.
FRENTE AMPLA
O que eu tenho defendido com a ideia da Frente Ampla é a compreensão de que, quando você está num quadro de defensiva estratégica, que é o que nós vivemos em 2013, e mais acentuadamente desde o impeachment, você tem de reunir forças para retomar as condições de apresentar o seu programa, transformá-lo [em] vitorioso e implementá-lo.
Quando você não consegue fazer isso sozinho, você busca alianças, como nós fizemos no Maranhão.
Eu reuni nove partidos em 2014 para enfrentar o político mais longevo da vida brasileira, o ex-presidente e ex-senador José Sarney [MDB].
E agora, [em 2018], para enfrentar a ex-governadora Roseana Sarney [MDB], reunimos 16 partidos exatamente porque reconhecemos que era necessário reunir forças para continuar mudando a realidade do nosso estado.
Às vezes, a gente fica preso a rótulos e esquece o conteúdo. Nós temos que olhar o conteúdo e, no conteúdo, é claro que eu vejo uma ameaça, minha gente.
O Brasil vive uma conjuntura de trevas. Nós temos uma ameaça objetiva à vida democrática, à dissolução da nação.
O nazismo está entronizado como política de Estado daqui e de acolá.
LULA
É a maior liderança popular da vida brasileira. Você pode fazer cem pesquisas e, em cem pesquisas, dará o ex-presidente Lula [PT] como, se não o melhor na visão de alguns, como um dos três melhores presidentes da vida brasileira.
Não é pouca coisa, é muita coisa. E ele está vivo. Graças a Deus.
É claro que o meu campo político se referencia na liderança do ex-presidente Lula, e por isso ele tem um papel muito grande, e espero que ele faça os movimentos necessários e cabe a ele, mais do que a mim ou qualquer outra pessoa, cabe a ele, sem dúvida, liderar esse rearranjo de forças.
2022
Só haverá uma chapa unificada [da esquerda] se a gente construir uma unidade desde já de outra forma. Não pode ser um processo atropelado em 2022.
Eu coloco como premissa, como pré-condição: nós temos que agora, em 2020, nas eleições municipais, atuar juntos no maior número de cidades quanto possível, seja em primeiro, seja em segundo turno.
Isso me refiro ao campo da esquerda, mas também à vertente liberal social-democrata da vida brasileira. Ou seja, em segundos turnos nós queremos o apoio do centro, e também apoiá-lo nas cidades em que ficarmos fora do segundo turno.
LUCIANO HUCK
Acredito que não há nenhum muro que deva ser visto como um intransponível. Agora, é preciso que as pessoas queiram.
E eu, particularmente, não tenho medo de crítica. Não preciso ficar disputando torneio de valentia.
Eu tenho coragem, tenho perspectiva, tem um lado, eu tenho seriedade, sei o que eu represento, o que eu defendo.
Sou militante da esquerda brasileira, defendo uma perspectiva social, os mais pobres, a soberania do país. Outras pessoas querem se somar a isso? É nosso papel trazer.
Eu prefiro Luciano Huck dialogando comigo do que dialogando com Bolsonaro.
Isso é elementar porque, se ele está dialogando com o outro campo, significa dizer que nós estamos alienando não apenas ele, mas, sobretudo, nós estamos afastando segmentos sociais que se sentem representados por ele.
Quando me reúno com o Fernando Henrique [Cardoso, ex-presidente], com o Luciano Huck, com o Rodrigo Maia [presidenta da Câmara e deputado pelo DEM-RJ], não estou reunido com o indivíduo. Estou mostrando que o segmento social que eu represento pode e deve dialogar com o segmento social que eles representam.
Eles possuem também legitimidade no jogo político e sempre foi assim. Não é hora de sectarismo.