Carolina Fonseca
“Logo que a sua saudação chegou aos meus ouvidos, o bebê que está em meu ventre agitou-se de alegria”, diz o verso 44 do primeiro capítulo do livro bíblico de Lucas, no Novo Testamento. O bebê que estremeceu de alegria no ventre da mãe era João, que mais tarde se tornaria São João Batista. A fala no versículo é de Isabel, no momento que recebeu uma visita de Maria, sua prima, em sua casa, ambas grávidas. Isabel esperava por João, Maria por Jesus. Os bebês, também primos, viriam a ser o profeta e o messias.
Este é um breve resumo do início da história da vida de São João. O santo bastante popular no Nordeste e é mote de uma das maiores e mais importantes tradições nordestinas: a festa junina. Diferentemente do costume católico, São João é o único santo cuja data em que é comemorado é a do seu nascimento – os demais santos são comemorados nas datas de suas mortes. O dia 24 de junho foi escolhido por aproximação, uma vez que, segundo a Bíblia, João teria nascido cerca de seis meses antes de Jesus, ou seja, do dia 25 de dezembro.
“A festa de São João tem várias camadas, dimensões pré-cristãs e interpretações do cristianismo. São João é tido, a partir da perspectiva cristã. É o último dos profetas do Antigo Testamento, simbolicamente, é o profeta que reconhece a chegada do novo. Tudo aquilo que Israel esperou por tanto tempo no texto que a criança estremece no ventre. É esse elo entre o Antigo e o Novo testamentos. Ele é primo segundo de Jesus, um profeta que anunciava a chegada do reino de Deus através do batismo e da remissão dos pecados. Jesus se deixa batizar por João. A partir desse batismo começa sua missão pública em Israel, como o profeta que anuncia e reconhece a chegada do novo tempo”, explica
Europa pré-cristã
Para entender como a festa de São João no Nordeste tornou-se o que é hoje, é preciso voltar no tempo e revisitar tradições da Europa pré-cristã. Neste período do ano, o hemisfério norte está entrando no verão, os dias escuros de inverno dão lugar a dias mais longos de verão. Neste momento, os povos comemoravam o fim da escuridão do inverno e para isso, festejavam em volta de fogueiras, que por sua vez simbolizavam e celebravam a luz que chegaria com a nova estação e também serviam para afastar maus espíritos e trazer boa sorte às plantações.
Ao ganhar força e se tornar a religião predominante no continente europeu, a igreja católica aproveita as tradições desta festa e as adapta – um mecanismo para ganhar a simpatia do povo. A relação de São João com a renovação e a profecia dos novos tempos tem encaixe perfeito com os festejos de chegada do verão e de renovação de toda a natureza. “(A festa de São João) está associada de fato à uma celebração religiosa ligada ao mundo agrário, tanto na Europa quanto aqui. A colheita do milho verdinho nesse período e aqui a festa foi ganhando outros contornos. A fé popular também dá outro significado à fogueira, que é o de que Santa Isabel, mãe de João, combinou com Maria, mãe de Jesus, de acender uma fogueira como sinal quando João nascesse”, acrescenta Douets.
Além da crença em São João, o profeta, primo de Jesus, representante desse elo com o messias e com a renovação, a festa que o celebra também é repleta de elementos derivados de costumes trazidos durante a monarquia. “No Nordeste há também a tradição rural de um período de colheita do milho, que vem de fevereiro até junho. No caso da Europa não é milho, mas aqui foi relacionado também a um período de colheita e, claro, a São João. Essa relação, com o passar do tempo, com a vinda da família real no século XIX, era comum se dançar a contra-dança, uma dança parecida com a nossa quadrilha e essas danças de cortes que se dança em pares terminou sendo incorporada também a esta festa que já era uma festa muito popular. A quadrilha é uma dança grande palaciana. Então o São João associa uma festa popular com danças de corte de palácio, e ai danças da época da monarquia, e essa junção de elementos vai dando contorno à dança no Nordeste”, exemplificou.
Festa importada
Assim como outros elementos e costumes da cultura popular brasileira, a festa junina também foi importada com a colonização. Uma vez importada, ganhou os contornos locais. “Há, com a vinda da família real, a introdução de certos aspectos que vão ganhando outros contornos. Embora tenha se tornado menos popular em algumas regiões, no Nordeste, por conta da manutenção de algumas tradições religiosas em comunidades rurais se enraizou. O São João também tem ligação maior com ambientes de aldeia, a relação dessa região mais rural, onde há maior devoção aos santos católicos e tem essa relação com a colheita”, explica Cibele Barbosa, historiadora e pesquisadora da fundação Joaquim Nabuco.
Europa pré-cristã e o fim do inverno
A chegada do mês de junho lembra ao nordestino que é tempo de festa, com ponto alto no dia 24. Inverno e época de chuvas no Nordeste, os festejos juninos também comemoram a colheita do milho, matéria-prima para as principais comidas típicas dos festejos dessa época. A festa é, no fim das contas, uma associação de elementos cristãos, agrícolas, populares e de heranças da época da colonização.
Para entender como a festa de São João no Nordeste tornou-se o que é hoje, é preciso voltar no tempo e revisitar tradições da Europa pré-cristã. Neste período do ano, o hemisfério norte está entrando no verão, os dias escuros de inverno dão lugar a dias mais longos de verão. Neste momento, os povos comemoravam o fim da escuridão do inverno e para isso, festejavam em volta de fogueiras, que por sua vez simbolizavam e celebravam a luz que chegaria com a nova estação e também serviam para afastar maus espíritos e trazer boa sorte às plantações.
Ao ganhar força e se tornar a religião predominante no continente europeu, a igreja católica aproveita as tradições desta festa e as adapta – um mecanismo para ganhar a simpatia do povo. A relação de São João com a renovação e a profecia dos novos tempos tem encaixe perfeito com os festejos de chegada do verão e de renovação de toda a natureza. “(A festa de São João) está associada de fato à uma celebração religiosa ligada ao mundo agrário, tanto na Europa quanto aqui. A colheita do milho verdinho nesse período e aqui a festa foi ganhando outros contornos. A fé popular também dá outro significado à fogueira, que é o de que Santa Isabel, mãe de João, combinou com Maria, mãe de Jesus, de acender uma fogueira como sinal quando João nascesse”, acrescenta Douets.