O presidente Lula surpreendeu muita gente ao abraçar a pauta da tarifa zero. Mas apenas os desatentos ficaram surpresos: essa tendência cresce entre as cidades brasileiras e o Ministério das Cidades trabalha há anos em propostas inovadoras de financiamento e gestão para superar a crise histórica do transporte público no país.
É fundamental que o Ministério da Fazenda se envolva no tema, mas o vizinho de Esplanada já está mergulhado neste debate desde que a pandemia “nacionalizou” a discussão, agravou a crise dos transportes e mobilizou prefeitos, técnicos e ativistas a debater o assunto com a Secretaria Nacional de Mobilidade Urbana. Resultado: mesmo que o setor ainda não tenha uma organização federativa como a saúde e a educação, já existem programas prontos para o governo abraçar, ainda neste ano, a tarifa zero com rigor e qualidade, transformando a realidade do nosso péssimo serviço no transporte.
mo a União não presta o serviço de transporte nas cidades, o ministério vem trabalhando exatamente em mecanismos de apoio aos municípios. O exemplo mais recente é o novo Refrota, e outras possibilidades deverão ser criadas pelo projeto de lei do Marco Legal do Transporte Coletivo, enviado há dois anos ao Congresso Nacional. Também há no Legislativo uma PEC que avança ainda mais e cria um Sistema Único de Mobilidade (SUM), nos moldes do SUS.
Com o Refrota e instrumentos do marco legal, o governo Lula conseguiria lançar um programa de gratuidade universal muito robusto, mudando a forma como o transporte público é prestado e visto no Brasil. Os programas envolvem mudanças nas formas de remuneração e na contratação das empresas de ônibus —cujos contratos enfrentam problemas recorrentes, como as chamadas “caixas-pretas” dos transportes—, unindo gratuidade e melhoria na qualidade do serviço.
As cidades que adotam a tarifa zero mostram resultados impressionantes: aumento no uso do transporte na cidade, maior circulação de pessoas, impulso no comércio, benefícios à saúde pública e até na qualidade e na gestão do serviço. Em muitos casos, com práticas mais modernas do que as das grandes capitais.
O apoio do ministro Fernando Haddad (Fazenda) ao projeto agitou o mercado financeiro, que teme deflação em curto prazo, mas é inviável que o programa provoque queda nos preços tão rapidamente. No entanto, não é preciso esperar que o projeto esteja completo, com o “SUM” implantado, para começar a transformar o transporte urbano, que hoje compromete a qualidade de vida e pesa no bolso de milhões de brasileiros.


