“Fico muito triste com o que estão fazendo com os outros pavilhões. O carnaval merece respeito”
Raissa Machado, rainha de bateria da Viradouro
Depois de um jejum de 23 anos, a Unidos do Viradouro voltou a ser campeã do carnaval carioca. Em arrancada nos quesitos finais, a Viradouro ganhou seu segundo título, com enredo que exalta a força das mulheres. Desfile consagrou nova geração de carnavalescos, como os campeões Marcus Ferreira e Tarcísio Zanon.
Com “Viradouro de alma lavada”, que ganhou o Estandarte de Ouro de melhor enredo e comissão de frente, a escola de Niterói arrebatou a Sapucaí com a homenagem às ganhadeiras de Itapuã—mulheres negras que fazem parte da história da Bahia—e com a bateria do Mestre Ciça. “Oh mãe, ensaboa, mãe”, dizia o refrão do samba que fez o público do Sambódromo cantar e se emocionar.
O vice-campeonato do carnaval de 2020 acabou com a Grande Rio, que liderou durante a maior parte da apuração. A escola de Caxias, no entanto, perdeu três décimos preciosos em evolução, penúltimo quesito. As notas abriram espaço para a virada da agremiação de Niterói, que terminou com os mesmos 269,6 pontos da tricolor da Baixada, mas venceu nos critérios de desempate. Em terceiro lugar, ficou a Mocidade Independente de Padre Miguel (269,4 pontos ), que homenageou Elza Soares. Completamo desfile das campeãs, no próximo sábado, Beija-Flor, Salgueiro e Mangueira. Estácio de Sá e União da Ilha foram rebaixadas para a Série A.
A vitória dramática gerou uma grande comoção entre os torcedores que lotaram a quadra do Barreto. No início da leitura das notas do último quesito, ritmistas começaram a armar abateria no palco, e integrantes se abraça ramem meio a lágrimas e sorrisos. Masa escola estava confiante. Tanto que cerca de dez mil torcedores da vermelho e branco já lotavam a quadra, por volta das 17h.A diretoria tinha comprado 17 mil litros de cerveja para a comemoração. A taça de campeã chegou às 19h30.
— Agora, Niterói vai ficar pequena para a comemoração deste título—disse, entusiasmado, Marcelinho Calil, presidente da Viradouro.—Nosso objetivo sempre foi reerguera escola e reforçara sua estrutura para competir de igual para igual. Em 2018, subimos da
Série A, e em 2019, fomos vice. E, hoje, vencemos.
Em meio à crise que atingiu as agremiações, que não contaram coma subvenção da prefeitura do Rio, avermelho e branco largou em vantagem, antes mesmo de pisar na Sapucaí: a escola recebeu R$ 2,5 milhões do município de Niterói. Além do dinheiro público, o poder político da cidade se fez presente: o prefeito Rodrigo Neves desfilou com amulhere afilha vestindo camisa da diretoria. Também estava co mele AxelGrael, secretário municipal de Planejamento e seu pré-candidato a prefeito para as próximas eleições, pelo PDT.
Outro político no meio da escola era o deputado estadual Paulo Bagueira (Solidariedade), casado com Raissa Machado, há sete anos rainha da bateria. Para ela, o enredo e a bateria fizeram a diferença:
— As ganhadeiras de Itapuã têm uma história que o Brasil precisava conhecer — disse ela, destacando a subvenção da prefeitura de Niterói. —Fico muito triste com o que estão fazendo com os outros pavilhões. O carnaval merece respeito.
A Viradouro levou para a Avenida a história do grupo de lavadeiras e quituteiras baianas que, nos séculos XVIII e XIX, juntavam dinheiro para alforriar companheiros e outras mulheres. Bem diferente de outros desfiles com temática ligada à Bahia, o visual da Viradouro foi sofisticado, com toques de modernidade dos jovens carnavalescos Marcus Ferreira e Tarcísio Zanon. O dourado reluziu no abre-alas. E, na comissão de frente, uma “sereia” surgia num aquário com milhares de litros d’água. Aliás, a escola de Niterói — cidade que não enfrenta o problema da água com geosmina da Cedae — comprou sete mil litros de água mineral para a apresentação de nado sincronizado.
ÚLTIMA VITÓRIA FOI EM 1997
Agrande preocupação da comunidade da Viradouro era com o quesito alegorias e adereços, depois de luzes de LED do último carro terem apagado. De fato, foi o quesito em que a escola perdeu mais pontos, três décimos no total.
A última e única vez que a Viradouro tinha sido campeã foi em 1997, com Joãozinho Trinta. A escola passou anos na Série A e só voltou ao Grupo Especial no ano passado, quando surpreendeu comum desfile assinado pelo carnavalesco Paulo Barros, terminando em segundo lugar, atrás da Mangueira. Avir adada escola na Sapucaí veio após a família Calil voltar à agremiação. O presidente atua léo empresário Marcelinho Calil, filho de Marcelo Petrus Calil, presidente de honra, e neto de Antônio Petrus Calil, o Turcão, ambos bicheiros. O avô morreu no ano passado.