No último fim de semana, o cantor Zeca Baleiro falava sobre a importância do posicionamento político de artista, durante um show que fazia na Festa Literária de Penedo (FliPenedo), em Alagoas, quando interrompeu a fala para dar uma bronca numa pessoa da plateia que gritou “E a Lei Rouanet?”. O cantor reagiu ( “Tu sabe o que é Lei Roaunet? Não sabe o que falar, não fala. Tem parente seu que foi beneficiado pela lei, porque isso gera trabalho para uma cadeia imensa de trabalhadores”, disse Zeca no palco) e pediu para ele se retirar, se quisesse.
Em entrevista ao GLOBO, Zeca disse que não se arrepende de sua fala e que nunca foi beneficiado pela Lei de Incentivo à Cultura, criada em 1991 e que autoriza fazedores de cultura a buscarem investimentos privados para o financiamento de iniciativas culturais. Como contrapartida, empresas podem abater parte do valor investido no Imposto de Renda.
— Nunca inscrevi nenhum projeto meu, de música, por me considerar um artista “de mercado” e achar que isso “concorreria” com projetos de artistas mais jovens ou menos conhecidos. Tive um musical infantil, “Zoró Zureta” inscrito por um empresário amigo, o Deco Gedeon, há uns 5, 6 anos. Mas, mesmo com o projeto aprovado pelo Ministério da Cultura, não conseguimos captar os patrocínios — disse ele.
Confira abaixo a entrevista com Zeca Baleiro.
O GLOBO: O que de, fato, a pessoa falou sobre a Lei Rouanet quando o senhor estava no palco?
Zeca Baleiro: Eu estava no meio do show falando sobre a consciência social e política que acho que o artista deve ter, quando o cara do nada grita “Lei Rouanet”. Totalmente sem propósito. O sangue subiu à cabeça e pedi para ele esclarecer. Ele não o fez, e daí eu disparei todo o fel que estava entalado. É um recurso dessa gente, simpatizante do neo-fascismo brasileiro, difundindo ódio e inverdades sem nenhum fundamento pra descredibilizar fatos, pessoas etc. Poucas coisas me incomodam tanto como a boçalidade dessa gente. Detalhe: a Lei Rouanet foi aprovada no governo Collor, nem é do PT, como querem fazer crer.
Abordagens como essa vêm sendo comum nos últimos tempos? Se sim, como geralmente é a sua reação? Essa foi diferente das demais?
Sim, infelizmente tem acontecido. E sim, essa foi diferente, mais indignada. Mas não me arrependo. Deve ser uma postura dos artistas hoje, repelir a maledicência e a estupidez.
O senhor vislumbra algum caminho para uma melhor comunicação do que é a lei, por partes de todos os entes envolvidos na triangulação dela, órgãos de governo, empresas financiadoras e também fazedores de cultura?
O caminho é esclarecer sempre que possível, e rever a lei, porque ela precisa de ajustes como toda lei. Mas demonizá-la está a serviço de um jogo político, de desacreditar artistas e políticas culturais. Enquanto isso, no interior do Brasil, sem passar por lei alguma, ingerência ou fiscalização, artistas ultrapopulares estão papando milhões em shows superfaturados com comissões astronômicas para atravessadores espúrios, todos eleitores dessa praga que acabou de deixar o governo.