O piloto Fernando Murilo de Lima e Silva, que salvou o então presidente José Sarney e mais de cem pessoas de um atentado ao Palácio do Planalto, morreu em agosto de 2020 com a mágoa de nunca ter recebido pessoalmente um agradecimento do ex-presidente. O caso, que virou filme, ganhou um novo capítulo. Trinta e cinco anos depois do episódio, em entrevista ao Estadão, Sarney disse aquilo que o piloto sempre quis ouvir: “Gratidão. Foi um herói”.
Fernando era o comandante do voo 375 da Vasp que, em 29 de setembro de 1988, foi sequestrado por Raimundo Nonato Alves da Conceição. Então com 28 anos, o maranhense estava desempregado e insatisfeito com a gestão Sarney. O avião saiu do Aeroporto de Confins, em Belo Horizonte, com destino ao Galeão, no Rio, mas teve a rota alterada a mando do criminoso armado, que pretendia jogar a aeronave sobre o Planalto. O plano não vingou graças a manobras do piloto.
Ao ver o aeroporto de Goiânia, o comandante operou a técnica chamada tonneau, quando o avião faz um giro completo sobre seu eixo longitudinal. Depois, fez um mergulho de 9 mil metros com a aeronave, girando em parafuso. Com a acrobacia, o sequestrador ficou desacordado.
Condecoração
No dia seguinte ao atentado, o piloto foi condecorado com uma medalha pela Força Aérea Brasileira (FAB) – recebeu uma insígnia da Ordem do Mérito Aeronáutico. Em entrevistas, no entanto, ele nunca escondeu a decepção com Sarney.
Procurado agora pelo Estadão, o ex-presidente concordou em falar. “Olha, já faz tanto tempo isso. Mas a verdade é que eu condecorei ele com a condecoração mais alta da Aeronáutica. Um herói”, disse. Sarney relatou ainda que, na época, não tinha muitas informações sobre o atentado. Hoje, afirmou que seu sentimento é de agradecimento. “Você conhece o meu temperamento, eu jamais deixaria de ter o maior carinho com ele, agradecimento e gratidão.”
Sarney também relembrou bastidores do governo. “Dentro do palácio não se sabia de nada. Não tinha informação, nem podia ter.” Ainda de acordo com ele, quando pediram que deixasse o Planalto por prudência, Sarney se recusou. “Não, vou ficar aqui. Se eu tenho que morrer aqui, vai ser aqui.”
A espera do piloto por um gesto que não veio em vida é retratada no filme O Sequestro do Voo 375, de Marcus Baldini, lançado no fim do ano passado. Sarney disse que ainda não viu o filme, mas ouviu comentários de amigos.
De O Estadão