RIO — Em meio à tramitação da reforma da Previdência na Câmara dos Deputados, trabalhadores que estão a poucos anos de se aposentar têm buscado formas de antecipar o tempo de contribuição necessário para dar entrada no benefício. Um dos questionamentos mais comuns é com relação ao pagamento de recolhimentos atrasados. Especialistas explicam que esse pagamento retroativo só é possível para quem é autônomo e, além disso, nem sempre é vantajoso.
Calcule aqui o tempo que falta para a sua aposentadoria
O advogado João Badari, especialista em Direito Previdenciário, explica que é preciso analisar caso a caso para avaliar se vale a pena fazer as contribuições atrasadas. Isso porque, além de pagar multas e juros, o trabalhador teria que dispor de valores altos, que nem sempre serão revertidos na aposentadoria.
— Em muitos casos, o segurado faz o pagamento das contribuições atrasadas, mas o INSS não considera esse tempo. Há casos em que o trabalhador pagou R$ 100 mil e depois teve que ir à Justiça buscar a devolução desse valor. Por isso, recomendo que primeiro a pessoa entre com um processo administrativo para que o INSS reconheça aquele tempo no cálculo. Para isso, é preciso provar que o trabalhador estava exercendo atividade naquele período em que não contribuiu. Depois que o INSS aceitar esse tempo, é feito o pagamento — aconselha.
Para Luiz Felipe Veríssimo, presidente do Instituto de Estudos Previdenciários (Ieprev), é preciso que o trabalhador coloque na ponta do lápis quanto irá gastar com o pagamento dos atrasados e em quanto tempo esse recolhimento irá antecipar a aposentadoria.
— Pode ser que com esse pagamento a pessoa consiga se aposentar automaticamente. Nesse caso, pode valer a pena, pois mesmo que fique caro, o segurado consegue recuperar esse valor depois ao longo dos anos em que estiver recebendo o benefício — avalia.
Confira os exemplos
Podemos usar como exemplo um homem que tem hoje 59 anos de idade e 35 de contribuição, e média salarial de R$ 4 mil. Supondo quer esse trabalhador autônomo ficou dois anos sem contribuir para o INSS, ele teria que pagar hoje R$ 30.720 de recolhimentos atrasados. Com isso, atingiria os 96 pontos necessários para se aposentar com o valor integral do benefício, ou seja, R$ 4 mil mensais. Os pontos são a soma da idade com o tempo de contribuição: como hoje ele tem 94 pontos (35 + 59), os dois anos a mais que seriam pagos resultariam nos 96 exigidos.
Caso ele não quisesse pagar esse tempo, continuaria podendo se aposentar hoje, já que tem 35 anos de contribuição. Porém, com fator previdenciário, que, neste caso, reduziria o valor do benefício para R$ 3.205.
Ou seja, ao pagar os R$ 30.720 relativos às contribuições atrasadas, esse trabalhador receberá uma aposentadoria de R$ 4 mil mensais: R$ 795 a mais que se não fizesse o pagamento. Em cerca de três anos, ele recuperaria o valor que pagou, de modo que esse investimento pode valer a pena.
Mas há casos em que o investimento não compensa. Por exemplo, um segurado que tenha hoje 64 anos de idade e 29 de contribuição, e ficou seis anos sem fazer o recolhimento como autônomo. Supondo que ele tenha uma média salarial de R$ 3 mil, esses seis anos resultariam em um pagamento de R$ 69.120 dos valores em atraso.
Para se aposentar imediatamente, ele precisaria de 35 anos de contribuição. Se ele decidir pagar o valor atrasado, se aposentará com R$ 3 mil, pois terá mais de 96 pontos. Contudo, essa mesma pessoa, caso não pague os atrasados e continue a contribuir com a mesma média até 65 anos de idade (por mais 1 ano) também receberia os mesmos R$ 3 mil mensais. Logo, teria desembolsado R$ 69.120 apenas para antecipar sua aposentadoria em um ano, o que não seria tão vantajoso.
Veja as respostas para as principais dúvidas sobre os pagamentos das contribuições atrasadas:
Quem pode pagar os recolhimentos atrasados?
Trabalhadores autônomos que deixaram de contribuir ao INSS durante um determinado período de tempo.
Há incidência de juros nesses pagamentos?
Sim. No caso de contribuições que serão realizadas referentes a períodos há menos de cinco anos, o segurado deverá pagar a correção pela Taxa Selic e multa proporcional ao período.
Já quem tem recolhimentos que serão realizados referentes a ganhos que ocorreram há mais de cinco anos paga 0,5% de juros ao mês até o máximo de 50% sobre o total, mais multa de 10%.
Sou funcionário da iniciativa privada e a empresa onde trabalho ou trabalhei não repassou ao INSS as minhas contribuições. Devo fazer esse pagamento?
Não. A obrigação tributária é de quem faz o recolhimento, que neste caso é a empresa. Mesmo que o empregador não repasse as contribuições do funcionário, elas são computadas e contam normalmente no cálculo da aposentadoria. A dívida é entre a empresa e o INSS. Porém, é importante que o trabalhador tenha comprovantes do salário que recebia nesse período em que não houve o repasse. Caso não haja comprovação, será considerado um salário mínimo para cada mês.
Posso pagar os recolhimentos futuros que faltam para completar o tempo de contribuição que preciso para me aposentar?
Não. Só é permitido pagar as contribuições atrasadas, não as futuras. Quem ainda não completou o tempo mínimo de contribuição deve continuar trabalhando ou, caso não esteja empregado, pode contribuir de forma individual.
De O Globo