Na aeronave que neste domingo (17) de manhã levanta voo da base aérea de Brasília, no Distrito Federal, com destino à base aérea de Andrews, no Maryland, Jair Bolsonaro leva consigo mais do que seis ministros, um porta-voz, um deputado federal e restante comitiva. Leva a esperança de que o encontro, na terça-feira (19), com a sua maior inspiração política, Donald Trump, e as reuniões paralelas com formadores de opinião internacionais, como Steve Bannon, o consolidem como um dos líderes da frente populista de direita à escala global. Para isso, o presidente do Brasil reforçará os laços – religiosos, económicos e militares – que o ligam ao seu homólogo dos EUA.
O colunista do jornal Folha de S. Paulo especialista em relações internacionais afirma que “o compromisso com a realização desta visita imediatamente foi intenso a ponto de Bolsonaro arcar com o custo de pular Buenos Aires como destino inicial”. “E Bolsonaro privilegia a Casa Branca porque acredita ter condições de obter benefícios para consolidar a sua posição junto aos três grupos sobre os quais se equilibra: a bancada religiosa, os militares e o mercado financeiro“, lembra ainda Matías Spektor.
“A ênfase da agenda externa brasileira é reforçar a relação com os países que podem contribuir para o desenvolvimento, a prosperidade, o bem-estar e a segurança dos brasileiros”, disse Orlando Rêgo Barros, o porta-voz do governo e um dos membros da comitiva, ao lado dos ministros Ernesto Araújo, das Relações Exteriores; Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional; Paulo Guedes, da Economia; Sergio Moro, da Justiça; Tereza Cristina, da Agricultura, e Ricardo Salles, do Meio Ambiente. E, claro, do deputado federal Eduardo Bolsonaro, terceiro filho do presidente.
Evangélicos
Na agenda oficial, está prevista uma reunião com líderes evangélicos na terça-feira(19). Mas durante o encontro a sós com Trump, a relação da administração norte-americana com o segmento religioso que ajuda a sustentar os dois líderes será também abordada. Assim como a mudança, em Israel, da embaixada dos Estados Unidos de Telavive para Jerusalém, que o presidente Trump já concretizou, e Bolsonaro por enquanto só prometeu.
“Mas a gente volta dos EUA, descansa dois ou três dias e depois parte logo para esse país irmão, vocês com toda a certeza gostarão muito do que a gente vai tratar lá”, disse o próprio presidente brasileiro durante o direto na rede social Facebook da última quinta-feira (14), anunciando a retribuição da visita de Benjamin Netanyahu ao Brasil, por ocasião da tomada de posse em Brasília.
“O nosso calendário é o calendário de levar a voz do Brasil para o mundo e trazer resultados concretos para o o povo brasileiro, o crescimento, o orgulho do país”, acrescentou Ernesto Araújo, titular das relações exteriores, nesse mesmo direto, em jeito de complemento.
Mudar a embaixada brasileira para Jerusalém é uma das exigências da Bancada da Bíblia, o grupo de deputados ligados às denominações evangélicas que apoiou Bolsonaro apaixonadamente durante a campanha mas demonstra nos últimos dias insatisfação com o seu peso, apenas relativo, e influência, cada vez mais esfumada, no governo.
Forças Armadas
Os militares também terão espaço na agenda. A assinatura do acordo que permitirá o uso da base de lançamento de satélites de Alcântara, no Maranhão, pelos EUA, é um dos itens mais publicitados. “O Brasil poderá ser o principal ponto de lançamento de satélites, isso pode trazer muitos recursos”, disse Ernesto Araújo.
Bolsonaro quer ainda reforçar o papel de aliado dos EUA na situação explosiva na Venezuela, vizinha do Brasil, o que trará ao país um estatuto geopolítico inédito, para satisfação das dezenas de militares espalhados pelo governo – essa é, aliás, de acordo com a imprensa americana, a principal motivação do lado da Casa Branca para o encontro.
A delegação deve trazer ainda de Washington o papel de aliado extra-NATO, concedido por Trump, e a promessa de compras na área da defesa.
Mercado
Por falar em compras, os impulsos financeiros e comerciais são o terceiro vértice da visita. Bolsonaro discursa no encerramento do Dia do Brasil em Washington, promovido pelo Conselho Empresarial Brasil-EUA, com foco em oportunidade de investimentos, e num jantar, organizado pela mesma instituição, subordinado ao tema “O futuro da economia brasileira”, ao lado de 40 executivos de grandes empresas.
A reforma da segurança social e outros temas caros ao ministro da Economia, Paulo Guedes, deverão ser encarados como prioritários nesses encontros. Esses recados serão usados politicamente pelo governo quando chegar a hora da difícil votação, talvez ainda no primeiro semestre, das pensões e de outros auxílios no Congresso Nacional.
Bolsonaro quer falar também com Trump da Amazónia, razão pela qual leva o ministro do Ambiente consigo. O presidente do Brasil defende total autonomia para cuidar da região como área estratégica brasileira porque, na visão da sua equipa, algumas ONG acabariam atuando para limitar a ação do governo brasileiro na região. O presidente Bolsonaro defende, por exemplo, a exploração de reservas minerais nas áreas indígenas na região amazónica. Para ele, o índio brasileiro, sempre que possível, deve ser integrado à sociedade brasileira, lucrando com a exploração de suas terras.
Ideologia
Teme-se, no entanto, que os EUA não vão, como era pretensão de Bolsonaro, fazer um esforço especial para ajudar as ambições brasileiras de integrar a OCDE, o chamado clube dos países ricos. E a delegação sabe ainda que alguns acordos não serão assinados já mas sim, eventualmente, no segundo semestre, quando é mais cômodo para os anfitriões do encontro. Por isso, Washington sugerira o adiamento da visita – mas Bolsonaro tinha pressa.
A pressa, voltando ao início, deve-se à vontade de marcar território na liga dos grandes líderes populistas globais, razão pela qual o jantar na residência do embaixador do Brasil de segunda-feira (18) à noite com formadores de opinião, como Olavo de Carvalho, guru de Bolsonaro radicado nos EUA, e Steve Bannon, ex-estratega de Trump e fundador do Movimento, grupo que agrega partidos nacionalistas, é considerado um dos pontos altos da visita.
DISCURSO DIRETO
Trump sobre Bolsonaro:
“Chamam-lhe [a Bolsonaro] o ‘Trump da América do Sul’, acreditam? E ele está feliz com isso. Se não estivesse não gostaria tanto dele. Mas eu gosto.“
“.”
Bolsonaro sobre Trump:
“O Trump serve de exemplo para mim, pretendo aproximar-me dele para o bem do Brasil e dos Estados Unidos.”
“Se o Trump seria um bom presidente do Brasil? O Jair Bolsonaro vai ser melhor, pode ter a certeza.”